Emissões de títulos ‘verdes’ já superam os US$ 5,3 bi

Instrumento é baseado em desempenho socioambiental

Valor Econômico - 02.02.2021
Por Andrea Vialli


O mercado brasileiro despertou para os títulos de dívida sustentáveis, que incluem os chamados green bonds e suas variações, como sociais, sustentáveis e vinculados a desempenho socioambiental. Em 2020 as emissões de títulos temáticos ligados a sustentabilidade somaram US$ 5,3 bilhões em 37 operações, mais do que o dobro do valor de 2019, de US$ 2,2 bilhões, de acordo com a Sitawi Finanças do Bem, consultoria especializada em finanças sustentáveis. O apetite por esses títulos se repete em 2021, quando seis companhias brasileiras já captaram US$ 2,2 bilhões com operações em bonds sustentáveis só no mês de janeiro.

Representando 1% das emissões globais, o mercado de títulos sustentáveis no Brasil ainda é incipiente, quando comparado a países da Europa e EUA, onde a tendência está consolidada. A primeira emissão de título verde, realizada em 2015 pela BRF, do setor de alimentos, foi o pontapé inicial e agora o país acompanha a tomada de consciência, por parte dos investidores, sobre aspectos ambientais, sociais e de governança (ESG).

“As empresas brasileiras que já captavam recursos no exterior vêm sentindo a demanda por papéis vinculados a estratégias de sustentabilidade. Isso já acontecia no mercado de ações e os investidores levaram suas preocupações socioambientais para a renda fixa também”, afirma Annelise Vendramini, coordenadora do programa de pesquisa em Finanças Sustentáveis do Centro de Estudos em Sustentabilidade da Fundação Getulio Vargas (FGVCes).

As questões relacionadas às mudanças climáticas, com o retorno dos EUA ao Acordo de Paris, também contribuem para o aquecimento dessa agenda.

As recentes emissões de bonds de empresas brasileiras prenunciam que os instrumentos baseados em desempenho das empresas nas questões socioambientais são a grande tendência para este ano. Os chamados SLBs (sigla em inglês para títulos vinculados à sustentabilidade) diferem dos green ou social bonds por financiarem o próprio desempenho em sustentabilidade da empresa e o cumprimento de metas na área. As empresas de papel e celulose Suzano e Klabin, o Grupo Boticário, de cosméticos, e a holding Simpar (ex- JSL), do segmento de logística, estão entre as companhias que emitiram SLBs nos últimos meses.

No caso da Simpar, que se tornou a primeira companhia de logística no mundo a emitir um título no formato SLB, a captação, realizada em janeiro, foi de US$ 625 milhões. Os títulos de dívida, com vencimento em 2031 e remunerados à taxa de 5,2% ao ano, estão vinculados ao compromisso da empresa de reduzir em 15% sua intensidade de gases de efeito estufa nos próximos dez anos, o que inclui tanto as emissões diretas da empresa (escopos 1 e 2), quanto as indiretas (escopo 3, originadas por clientes e fornecedores, que respondem por cerca de 75% dos gases gerados pela operação).

Segundo Denys Ferrez, diretor de relações com investidores da Simpar, a opção pelo título SLB ocorreu em razão do amadurecimento do tema da sustentabilidade na gestão corporativa do grupo. “Fez todo o sentido transformar a transação em um compromisso público para a redução das emissões de gases de efeito estufa”, diz.

Entre as estratégias que deverão ser adotadas para reduzir a intensidade de carbono das operações estão a maior utilização de veículos elétricos nas frotas e adoção de tecnologias que emitem menos carbono, além de substituição de combustíveis fósseis por renováveis. Agora, a empresa de locação de veículos Movida, que faz parte do grupo, prepara a emissão de bonds sustentáveis no mercado internacional para as próximas semanas.

A aposta nas emissões de bonds ligados ao desempenho de sustentabilidade das empresas está crescendo porque representa uma facilidade para as companhias, que não precisam delimitar o destino dos recursos para algum projeto específico. “Esse instrumento abre portas para empresas que tinham a ambição de acessar o mercado de títulos de dívidas sustentáveis, mas sem ter o uso do dinheiro pré-definido, o que é importante no atual cenário de recuperação econômica pós-pandemia”, diz Cristóvão Alves, gerente de finanças sustentáveis da Sitawi.

A consultoria fomenta o mercado de títulos verdes desde 2014 e já atuou na estruturação de mais de 70 operações. Com novos setores entrando no segmento, os investidores devem observar alguns critérios para evitar comprar títulos que possam cometer o chamado greenwashing, ou “maquiagem verde”. “É importante que o mercado observe as práticas da empresa no campo da sustentabilidade e também se a operação conta com uma avaliação independente”, diz.

Outra tendência é a entrada de bancos e empresas do setor financeiro no segmento dos títulos sustentáveis. Desde dezembro de 2020, os bancos Bradesco, Itaú, BTG Pactual e o Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais (BDMG) emitiram papéis com esse perfil, o que deve dar fôlego para o financiamento de atividades que geram impactos socioambientais positivos. O BDMG, por exemplo, captou US$ 50 milhões com a emissão de bonds sustentáveis que terão o objetivo de viabilizar linhas de crédito para empresas e municípios mineiros alinhadas aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) das Nações Unidas. Serão elegíveis projetos nas áreas de eficiência energética, saneamento, urbanização, saúde, gestão de resíduos, entre outros.

Foi a primeira emissão de um banco de desenvolvimento na Bolsa de Nova York e elas devem se tornar recorrentes, diz Sergio Gusmão, presidente do BDMG.





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