Valor Econômico - 12/12/2019
Por Mehreen Khan
A União Europeia (UE) anunciou ontem uma ampla iniciativa ambiental voltada para a criação do primeiro continente do mundo neutro em carbono até 2050. O plano aborda tudo que vai de regras de ajuda estatal, política industrial ecológica e um imposto de carbono para importações.
No seu aguardado New Deal Verde para a Europa, divulgado ontem, a nova Comissão Europeia (CE), presidida pela alemã Ursula von der Leyen, estabeleceu 50 políticas, a serem implementadas nos próximos três anos, para reformular normas e regras que atendam às ambiciosas metas climáticas.
A UE quer se tornar o primeiro grande bloco econômico a alcançar emissão líquida zero de carbono até 2050 e vai propor um projeto de lei em março para formalizar essa meta. A nova CE quer ainda reforçar metas de médio prazo, cortando as emissões em 50% a 55% até 2030, ante a meta atual de 40%.
A Comissão pretende mobilizar € 100 bilhões do orçamento da UE e empréstimos do Banco Europeu de Investimentos para financiar uma “transição justa” nos países-membros mais pobres do Leste Europeu, cujas economias dependem de combustíveis fósseis.
“O New Deal Verde é o momento ‘homem na Lua’ da Europa”, disse Leyen. “Nosso objetivo é reconciliar a economia com o planeta. O velho modelo de crescimento, baseado nos combustíveis fósseis e na poluição, está ultrapassado e desligado do nosso planeta.”
O New Deal Verde é a primeira grande iniciativa do novo executivo da UE, que assumiu neste mês. A primeira missão de Leyen será convencer Polônia, Hungria e República Tcheca a apoiar a meta de emissão zero para 2050 em uma reunião de cúpula hoje, em Bruxelas.
Os três países já disseram que não vão se comprometer com a meta se não receberem bilhões de euros em ajuda financeira para fazer a transição. Os detalhes do Mecanismo de Transição Justa, de € 100 bilhões, serão anunciados em janeiro e vão mirar “regiões e setores mais vulneráveis”, disse Leyen.
Um dos elementos mais polêmicos do New Deal Verde é o “mecanismo de ajuste de carbono na fronteira”, a ser proposto em 2021.
A UE quer se reservar o direito de taxar seletivamente produtores estrangeiros para proteger suas empresas da concorrência injusta de países que não respeitarem as metas internacionais para o clima. Autoridades disseram que a Comissão vai avaliar um imposto de fronteira que começará com as importações de aço e cimento.
A proposta enfrenta complicações, pois precisa evitar infringir regras da Organização Mundial do Comércio (OMC) e há risco de retaliações de parceiros comerciais. Marcia Bernicat, embaixadora dos EUA na CoP 25 da ONU, disse que qualquer imposto cobrado pela UE sobre o carbono “será de grande preocupação para nós”.
Outras medidas do New Deal Verde incluem a revisão das regras de ajuda estatal da UE, para permitir aos governos investir em tecnologias que reduzam as emissões de carbono. A Comissão também vai propor a reformulação da norma sobre a tributação de energia, para abrir as portas para um imposto sobre a aviação e os combustíveis para aviões no âmbito do bloco.
Autoridades disseram que os planos de tributação ainda se encontram nos estágios iniciais e provavelmente enfrentarão grande resistência de governos da UE, que veem a política tributária como uma parte do poder nacional.
Leyen terá de conseguir uma maioria entre os governos da UE e parlamentares europeus para conseguir aprovar suas propostas. Os verdes do Parlamento europeu querem um corte mais ambicioso, de 65% nas emissões até 2030, enquanto grupos conservadores já alertaram que a aceleração da meta trará prejuízos às empresas.
Franziska Achterberg, porta-voz do Greenpeace para a UE, disse que as metas climáticas são “insuficientes e chegam tarde demais”. “Ao adiar sua proposta para a meta de redução das emissões até 2030, a Comissão poderá enfraquecer o Acordo de Paris e qualquer esperança de liderança da UE na questão do clima.”
Num sinal do quanto a política climática divide opiniões na UE, ontem os países do bloco não conseguiram chegar a um acordo sobre um sistema de regras para finanças sustentáveis, depois que a França pressionou pela inclusão da energia nuclear. As discussões foram interrompidas quando França, Reino Unido e vários países do Leste Europeu disseram que não poderão apoiar um acordo a menos que a energia nuclear receba uma “luz verde” sob o novo sistema de classificação.